Procuro em mim aquilo que quero
fazer, quais são meus desejos, quais a vontades e um objectivo a cumprir. Esta
nova revolta de valores, palavra já tão sem sentido, apenas trás mais confusão,
eu sei que tenho que trabalhar e ocupar meu tempo, sei que tenho que deixar de
pensar nela e das infinitas formas que penso para a reconquistar, é tempo
inútil, não volta mais.
Talvez só me reste a fuga, quando nada se tem a perder mais vale partir à procura do que procurar sempre na mesma fonte.
Durante demasiado tempo tive medo e vergonha de
amar, tinha deixado de fazer sentido, agora é o mais alto valor que tenho e o único que não consigo preencher,
o peito tem formas tão curiosas de agir.
Vou a locais novos à procura de
almas antigas, encontro pessoas cansadas, envelhecidas, consumidas por um medo
que temo ser igual ao meu, apenas dez anos passaram, o que é que nos
aconteceu?!
Caminho horas sem fim por esta
cidade, a cidade que já consumiu tudo o que tive para dar, há recordações nas
pedras da calçada, caminhos percorridos entre abraços e beijos longos. Corpos
de mulheres cansadas e corpos de mulheres com desejos, corpos, corpos absortos
em qualquer coisa que os fascine. Paredes e ombreiras de portas onde nossos
corpos rolaram, janelas abertas para quartos pintados de vermelho sangue e
onde lá dentro nada mais se encontra a não ser o abandono do peito, é nesse quarto que
se deixa a dor, onde fica lá para apodrecer, para poder-mos continuar a
caminhar, de novo na procura de um amor que nos estilhace o peito pela ultima
vez, fechou-se a porta do quarto azul trancada por dentro e com as janelas entaipadas com as tábuas de um velho banco de jardim, aquele que foi só nosso, dois amantes
enjeitados pela maldição, aquela maldição em que ninguém acredita mas da qual
todos sofrem.
O nevoeiro que habita dentro da
minha cabeça não permite ver para fora, deturpa o pensamento, começa a trocar as
personagens do filme, meu amor tem apenas um sentido, mas tantos corpos pelo
caminho, tantos seres que imploraram e os deixei à espera do coveiro, enterrei-as
vivas.
Eu sim sou o ser frio e cruel,
ainda agora a minha doente mente me leva para a entrada de tua casa, paredes revestidas a cortiça, degraus gastos e cansados, num sonho em que
tudo corre bem, tu vens à porta num contra luz suave, acabaste de tomar banho e
de secar o cabelo, emanas luz, os teus olhos depressa ficam vermelhos das lágrimas
que correm da saudade, nada dizemos, olho no profundo verde das portas da tua
alma, trazes vestido umas meias às riscas pretas e cinza e aquela saia escura, grossa com o seu negro já desbotado de tanto uso, que tanto gosto,
uma pequena camisola de alsas bordô, que revela o alvo doce dos teus ombros,
estás descalça, sentes-te em casa, estás feliz por estar-mos, de novo, nós.
Neste momento o coração para e a mente prega
mais uma partida quando me chama à atenção que não estou a viver a realidade,
fecho os olhos por momentos para tentar sentir o beijo e o peito que tanto
quero, em vão o faço, apenas a minha velha companheira cá está, bem vinda,
solidão.
Sem comentários:
Enviar um comentário